terça-feira, 29 de maio de 2012

Ashes





Esticou o braço para alcançar o cigarro que estava na cabeceira. Alta madrugada e continuava acordado; “Shit! Foda-se o relógio! Por que eu não consigo dormir?”.  Esparramou-se desconsolado na cama. Seus únicos movimentos eram os de tragar o cigarro e por as cinzas na lata de cerveja em baixo da cama.  O ambiente é de uma agonia surda que consome aos poucos cada ínfimo lampejo de alegria e contentamento.

Depois de muito relutar venceu a inércia e foi a sua cozinha buscar outra bebida. Na porta da geladeira um lembrete escrito por ele mesmo sentenciava: “Amanhã às sete horas buscar T na rodoviária”. Não importava o quanto franzisse as sobrancelhas, não conseguia lembrar de maneira alguma de ter colocado aquele bilhete ali.

 “T”? Quem poderia ser? Ele nunca gostou de fazer favores, e não poderia ser nenhum amigo posto que os poucos que possuía saberiam que as sete não importava se da manhã ou da noite ele já estaria “louco” demais para dirigir.

Quando ele era adolescente teve uma namorada chamada Teresa, ou teria sido Telma? Não, absolutamente impossível de ter marcado para si um compromisso com alguém que ele sequer lembrava o nome. Tragou mais um cigarro para esquecer como passou toda sua vida tentando fincar raízes, estabelecer um relacionamento duradouro, uma vida pacata, rotineira. - Dias de Sol na praia não foram feitos para “porra-loucas” como nós.  Dizia batendo em seu ombro um velho amigo que a noite tragou mais cedo que a alegria incontrolável das primeiras paixões.

 Não poderia ser ninguém do escritório que ele devesse ir receber na rodoviária. Havia sido despedido há duas semanas por ter chegado atrasado durante o mês inteiro. Nunca se acostumou com horários fixos, cobranças de resultados, cada tique-taque do relógio aumentava o seu tormento, ele podia imaginar uma ampulheta invisível pela qual sua vida escoava constantemente.

Escorou-se na parede e fechou os olhos desejando simplesmente dormir. Quem sabe com um pouco de descanso lembrasse quem era “T”?! Quem sabe depois de um cochilo toda a sua vida pudesse ser consertada. A sonolência é fascinante! Primeiro o peso do cansaço, depois uma sensação de amortecimento que vai tomando todo o corpo.

Ao meio dia o calor invadiu todo o apartamento fazendo com que ele acordasse mesmo ainda tendo muito sono. Com um sobressalto lembrou-se que havia perdido o horário de ir a rodoviária buscar não sabia ao certo quem. Quando chegou a cozinha lá estava ela, linda e sorrindo-lhe com um sorriso familiar. Aliviado, desejou que seus beijos e o calor daquela tarde livrassem-no da agonia de estar vivo.

segunda-feira, 7 de maio de 2012

Despedida


                                                                                                                  Um texto para te esquecer,

Vai embora, parte de uma vez sem remorsos e sem lembranças. Sai e leva contigo todas estas noites mal dormidas, estas olheiras que não me deixam reconhecer meu rosto, leva contigo até essas ilusões que eu desenhei no vento, e como brisa que eram cessaram na primeira tarde de Sol escaldante.  Pode levar tudo, a imagem dos teus olhos verdes que quase sem querer eu não paro de olhar, de procurar no meio da multidão, e quando encontro não me olham, e se me olham eu não sei se eles conversam ou simplesmente emudecem. E se falam que dizem para mim?

Vai embora, põe na mochila todo este nada que construímos todo este devaneio que a minha teimosia insistiu em forjar. Não te preocupas, que o fardo que tu levas é leve, nada pesa esta minha neurastenia. A única injustiça que cometo é que tu o carregas sem saber, não pedi tua permissão. Se por ventura ou desgraça descobrires por fim esta minha tolice, não me culpe, nem pragueje. Se tu buscas um culpado, então culpa teus olhos, teus dentes, teu rosto, tua boca e por fim todo teu corpo, que como ardilosa tentação foi me chamando, e eu fui entrando, fogueira adentro só pelo prazer de sentir as labaredas em meu corpo.

Coisa louca são as emoções, elas brincam com os homens constantemente, elevando-os às alturas para contemplar a beleza da eternidade, e depois lançam-nos  ao chão; sem emoções e sem vida jaz o corpo da pobre criatura na terra.

Agora, deixo-te ficar nestas linhas, como um blues triste e demorado. Como uma despedida do que nunca existiu.